Por Lucila
No início, o
homem precisava saber quem era, o que eram as manifestações da natureza, quem o
criou..., e assim surgiram as primeiras religiões. Politeístas, tradicionalmente
orais, as religiões eram donas de um saber absoluto, pois para tudo elas tinham
uma explicação. Através delas foram criadas as primeiras noções de moral e de
conduta do individuo em sociedade.
Com a escrita
surgiram duvidas que as religiões, através das suas respostas fantásticas, não
satisfaziam e com elas nasceu a filosofia e a ideia da ética como princípio
para a convivência social. As religiões antigas tornaram-se mitos e novas
religiões apareceram para satisfazer o dualismo humano.
Atualmente, a
sociedade é formada por um ciclo entre a moral e a ética, a moral é
estabelecida através das forças de controle social (religião, pais, amigos), e
a ética através do senso crítico e da reflexão do individuo quanto ao que é
estabelecido pela moral. Quando uma atitude passa a ser tomada através de uma
reflexão, baseada em um princípio ético, por grande parte de sociedade, é
possível dizer que àquela atitude ética se tornou uma atitude moral por ter
abrangido uma grande parte da sociedade.
A mulher durante
muito tempo não trabalhou fora de casa, com remuneração, pois seriam
consideradas imorais, inadequadas, trazendo constrangimento as outras mulheres.
Com a reflexão dessa moral, e a luta das mulheres por igualdade, atualmente, é
imoral pensar que uma mulher não pode exercer atividades remuneradas, dentro ou
fora de casa.
No entanto, a
maioria das religiões não se modifica junto com a sociedade. Tabus quebrados,
derrotados pela sociedade, dentro das religiões continuam vigorando
independente do que a sociedade exponha de novo sobre aquela moral. Para
algumas religiões, a mulher sempre terá que servir ao homem, os métodos de
prevenção a doenças e gravidez indesejada não será utilizado, o aborto é um
sacrilégio e o casamento gay nunca será realizado. Esta petrificação das
religiões é estabelecida por leis divinas, para eles superiores as leis humanas.
Na religião
católica, os sete sacramentos são instituídos por Jesus Cristo, para produzir a
graça nas almas cristãs e santificá-las. O casamento é a confirmação do ultimo sacramento
religioso, nele é firmada a união com a benção de Cristo. Nos princípios
cristãos só são estabelecidos casamentos entre homem e mulher, portanto, o
casamento gay seria inconcebível dentro da religião Católica.
Seguindo o mesmo
pensamento, outros conflitos são estabelecidos entre a moral religiosa e a
ética da sociedade, como a transfusão de sangue que não é aceita pelas
Testemunhas de Jeová, nem nos casos de risco de morte. Neste caso a transfusão
ocorre sem a devida permissão, desrespeitando os dogmas da religião, devido à
ética profissional dos médicos, que exigem a tentativa de salvar a vida em
todos os casos.
Na Bahia, em
específico Salvador, o sincretismo religioso, a mistura de crenças, é tradicional,
sendo comum a mesma pessoa que frequenta um terreiro de Candomblé, ir a uma
missa em uma Igreja, em um Centro Espírita e até mesmo em um templo Evangélico.
Em Salvador, Católicos e Candomblecistas fazem caruru e distribuem queimados, em
Setembro, para Cosme e Damião. Ogum é Santo Antônio, Oxóssi é São Jorge, Iansã
é Santa Barbara, Oxalá é Jesus Cristo e assim vai...
Na Bahia, a
ética e a moral das religiões se misturam, e o que não poderia ser concebido em
outra parte do mundo, na Bahia acontece...
O acarajé é uma
comida tradicional baiana reconhecida e registrada e protegida no Livro Saberes
e Fazeres, como Oficio das Baianas de Acarajé, pelo Instituto do Patrimônio,
Histórico e Artístico Nacional – IPHAN. Utilizado como oferenda para Iansã, o
acarajé é comercializado por baianas devidamente caracterizadas em trajes afro,
oferecidos em tabuleiros, com acompanhamentos também ligados a culinária africana.
Durante algum
tempo, o acarajé passou a ser comercializado por evangélicos que passaram a chama-lo
de “bolinho de Jesus”. A receita, os ingredientes e o modo de preparo indicam a
produção do acarajé, mas na verdade o que esta sendo produzido é o bolinho de Jesus.
Neste caso, há uma apropriação da cultura africana pela religião evangélica,
minimizando a religiosidade, a crença africana, do candomblé.
Percebemos uma forte mudança na tradição quando adeptas do candomblé se
tornam protestantes. Mesmo professando uma nova crença, desejam manter sua
fonte de renda. Para isso, decidem retirar todos os signos que liguem o quitute
à religião africana, como a roupa branca, o turbante e as contas no pescoço.
Desfiguram o ofício ao querer que o acarajé seja visto não como oferenda, mas
apenas como refeição. (MARTINI, Gerlaine.)
A moral evangélica,
no sentido doutrinário, esta sendo afastada para a produção de um “bolinho” que
em todo o momento de preparação representa a manifestação sagrada do Candomblé.
Estando presente, ainda que com outro nome, o alimento de Iansã, oferenda à
rainha dos raios e trovões.