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terça-feira, 28 de maio de 2013

Deus e os seus nomes

Por Lucila Paixão
 Dudu chega do colégio cheio de dúvidas na cabeça:
– Mãe, quem é Deus?
A mãe estava ocupada na cozinha, mas se propõe a responder à pergunta:
– É o criador do universo, dono do mundo, um ser bom. Ele é o nosso Pai  e de todos os homens e mulheres deste mundo.
– hum... Um ser bom. Ele é procurado não é?
– Bastante, todo mundo, até quem não acredita, o procura.
Com ar de preocupação, Dudu senta-se no sofá e respira fundo...
– Hunf... Sabia! Tadinho...É por isso que Ele tem tantos nomes!
A mãe sorri, e senta-se junto a ele.
– Como assim, menino? Tadinho!! Hum! Deus é Deus!
– Nada disso!  O Padre Reginaldo disse que o nome de Deus é Deus, mas Paulinho disse que o nome Dele é Olorum!
– Quem é Paulinho?
–Paulinho, o filho de dona Cândida. Ele faz banca comigo.
– Ele é de que religião? Umbanda? Candomblé?
– Ele é da Umbanda, mãe.
– Umbanda, Candomblé, é tudo a mesma coisa!
– Não é nada! Mas o que tem a ver isso?
Revoltada, a Dona Marieta, a mãe de Dudu, levanta-se do sofá e diz:
– Não quero mais você andando com ele! Mania de andar com quem não deve!
– Por quê?  Só porque, para ele, Deus é Olorum? Você não disse que ele era muito procurado? Até o tio Claudio diz que o nome Dele é Alá!
– Seu tio é um abestalhado que se envolveu com uma mulçumana e agora se diz Islão!
– E a Sabrina, sua melhor amiga, que vive dizendo que Jeová vai voltar? 
– Jeová é Deus, menino!
– E Olorum e Alá também não são outros nomes de Deus?
– Ah! Já chega de tanta conversa! Que menino que pergunta demais!
A mãe retorna aos seus afazeres na cozinha indignada. Como pode seu filho estar dizendo um absurdo desses.
Mas Dudu não desiste e segue a mãe até a cozinha.
– Mas mãe...
Dona Marieta interrompe. Ela havia passado o dia todo cuidando da casa. Estava chateada com o carteiro que só lhe havia trazido contas para pagar, com o encanador que prometeu chegar até às 11 horas para ajeitar a pia entupida , mas até aquela hora não chegara – e já passava das 13h. Estava sentindo-se cansada e injustiçada, aí chega seu filho, para completar, cheio de duvidas sobre Deus, algo que para ela sempre foi muito simples de entender.
Nascida e criada na religião católica, com direito a batizado, catequese e crisma, Dona Marieta sempre criou os filhos seguindo a sua religião. Devota de Santo Antônio, o Santo Casamenteiro e de Cosme e Damião, frequenta a missa das 18h e participa da Trezena de Santo Antonio todos os anos. Era inadmissível, para ela, que seu filho de oito anos, praticamente com oito anos frequentando a Igreja Católica, viesse lhe fazer tais perguntas.
– Nada de “mas mãe”! Vai pegar minha sacola que nós vamos à Feira de São Joaquim.
Carlos Eduardo, o Dudu, sempre foi curioso e quando se via com duvidas não se conformava enquanto não alcançasse uma resposta convincente para ele, que o fizesse compreender o que tanto o afligia, e como não obteve isso da mãe, continuou a insistir:
– Ah não, mãe! Ainda tenho duvidas, porque não dão um sossego a Deus?
Ela respira fundo, como se quisesse controlar a fúria, pois a vontade que lhe ocorria naquele momento era de lhe dar “uns tapas” e coloca-lo de castigo, resolve deixar o filho falar.
– Como assim Dudu?
– Por que não param de pedir coisas a Ele, tudo têm que recorrer a Ele; será que ninguém entendeu o porquê de tantos nomes, de tantas religiões diferentes?
– Onde você quer chegar Carlos Eduardo!
– Ora mãe, não vê que o porquê do bichinho ter tantos nomes? É que o procuram demais, aí quando ele quer um descanso, ele muda de nome, aí vocês vêm de lá e descobrem o novo nome dele. Tadinho! Porque não o deixam em paz?
Dona Marieta percebeu que esta batalha estava sendo perdida e teria que conversar com ele sobre o assunto, mas naquele momento, com os ânimos aflorados, estava sem paciência para ter um diálogo sereno, resolveu transferir a conversa para outro momento.
– Ai, ai Dudu, só você mesmo! Na volta da feira conversaremos sobre isso. Tem muita coisa que você precisa entender. Cada religião é uma religião e fim de papo.
Percebendo que não teria espaço para conversar naquele momento, mas havia conseguido uma possibilidade de tirar suas duvidas em outra ocasião, Carlos Eduardo se contentou e resolveu esperar pela volta da feira.
– hunf... tá!
E mudou de assunto.
– Mãe? O que vamos comprar na feira?
- Quiabo, amendoim, milho de pipoca, milho branco, feijão, azeite, cana, rapadura... Setembro está chegando, meu filho. Tenho que fazer o Caruru de Cosme e Damião.
Carlos Eduardo sorriu, e pensou... “é... cada religião é uma religião... em qualquer lugar, menos aqui!”


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